quinta-feira, 27 de outubro de 2016

Sobre Crises e Corrupção

Quando pensamos em crises generalizadas, geralmente vem à mente uma série de coisas, de desastres naturais à ataques à infra-estrutura. Mas existe um agente que talvez não seja levado em conta por muitos sobrevivencialistas. A corrupção.
Um exemplo claro de como a má administração causou tragédias localizadas, mas muito graves foi o vazamento de lama em Mariana. Bastaria que os órgãos de fiscalização fizessem seu papel que os problemas da barragem da Samarco teriam sido detectados à tempo e providências teriam sido tomadas a fim de evitar o seu rompimento.
Mas, a questão é bem mais complicada do que parece à princípio. Existe uma gigantesca batalha econômica por trás das administrações governamentais. Ninguém é tão estúpido para não perceber diversos problemas que, com soluções relativamente simples poderiam ser evitados. O negócio é: Quanto isso vai custar? Quanto isso vai afetar os meus lucros? Que alternativas minha empresa teria para achar uma solução mais barata?  Então, muitos empresários, que visam somente os lucros, embora as suas empresas invistam em propaganda (enganosa) para fingir que se importam com o meio-ambiente e com as pessoas, acabam "fazendo de reféns" os gestores públicos (isto quando eles próprios não são os candidatos à cargos públicos). Num processo de "toma lá, da cá", grandes corporações bancam as campanhas políticas de candidatos aos cargos nas diferentes esferas de poder, e, em troca, interferem nos governos, apoiando leis e medidas que lhes beneficiem e barrando as que vão contra os seus interesses. O gestor público não passa de um fantoche das corporações, e coloca os seus interesses pessoais e financeiros acima dos da população, sem o menor remorso. E estas corporações, muitas vezes tem capital estrangeiro, especialmente de países onde a opinião pública já não permite certos tipos de exploração. O sistema está tão contaminado que as empresas pagam as campanhas de candidatos adversários entre si, numa clara demonstração de que, cada vez mais, elas é que detêm o poder na prática. E, mesmo empresas concorrentes acabam costurando acordos que as beneficiam mutuamente, como num gigantesco (e invisível) cartel.
Mesmo quando essas corporações acabam não conseguindo fazer valer os seus pontos de vista em escala governamental (o quem tem se tornado cada vez mais difícil de acontecer), e acabam sendo punidas pelos seus erros, como no caso de Mariana, as punições, além de brandas, ainda demoram muito tempo para serem cumpridas.
A frouxidão nos mecanismos de fiscalização aqui no Brasil é causado sim pela falta de recursos. Mas esses recursos são controlados por políticos atrelados à grandes empresas. Então, eles mantém esses mecanismos funcionando da pior maneira possível, apenas para dar uma resposta à sociedade civil e que, verdade seja dita, pouco se importa com isso. Talvez se órgãos como o IBAMA ou a FUNAI fossem extintos, quase ninguém notaria a sua falta. Não há nenhuma punição adicional se as empresas não cumprirem com seus acordos originais. E elas não se sentem compelidas à cumpri-los. Além disso, muitos fiscais, que procuram fazer o seu trabalho da melhor forma possível, são intimidados de muitas maneiras. Sem falar em alguns que, em troca de propina, simplesmente não fiscalizam, ou omitem falhas.
O problema é que chegamos à um ponto em que as decisões governamentais (ou a falta delas) envolvem áreas cada vez maiores, com consequências para um número cada vez maior de pessoas. Claro que as grandes corporações e seus empresários estão pouco se lixando para isso, O que se mostra de uma cegueira e estupidez impressionantes. Um exemplo.
A quase total permissividade ao desmatamento na Amazônia está alterando o regime de chuvas no Brasil. Estivemos muito próximos de um colapso hídrico na região mais rica do país, e é muito provável que a situação volte a se repetir num futuro próximo. Imagine uma cidade como São Paulo sem abastecimento de água. O colapso econômico resultante disso poderia trazer sérias consequências para o país inteiro.
E este tipo de comportamento se espalha pelo Brasil e pelo mundo. A ameaça é cada vez maior e os tentativas de deter este movimento destrutivo se tornam cada vez mais esporádicas e ineficazes. Uma prova disso é que, embora haja um grande apelo ecológico nas últimas décadas,  a devastação dos ecossistemas planetários jamais foi tão grande quanto nos últimos 40 anos. Cerca de 60% dos animais selvagens foram dizimados nesse período. Só neste século, o mundo perdeu 2 milhões de km² de área florestal; Isso equivale à uma área maior que a do estado do Amazonas.
Para completar, temos uma opinião pública totalmente alienada e desinteressada. Vemos importantes centros urbanos brasileiros com uma série de problemas, que vão desde a segurança, passando por transporte, até o abastecimento de água, e as pessoas aceitam isso de forma passiva e natural. É impressionante notar que a mobilização criada em torno da proibição das vaquejadas no país foi muito maior do que a discussão sobre o abastecimento de água nas cidades em regime de racionamento. Não vou entrar no mérito da legalidade ou não da vaquejada. Mas certamente é um assunto sem importância, se comparado à água. Existem centenas de outros absurdos dos quais sequer ficamos sabendo. Mas, sinceramente, saber deles não modificaria grande coisa.
Diante deste cenário, onde temos uma política de exploração predatória, de mudanças climáticas e ambientais causadas por este modelo, de baixíssimos investimentos em prevenção e controle de desastres e do desinteresse total da maioria da população, além da corrupção desenfreada, devemos nos preparar para dias difíceis, embora sempre esperando que um milagre aconteça e que o futuro, de repente, se torne menos assustador.

"Somente quando for cortada a última árvore, poluído o último rio, pescado o último peixe, é que o homem vai perceber que não se pode comer dinheiro."
Greenpeace

Esta é uma reflexão um pouco mais profunda sobre este artigo que escrevi anteriormente.


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